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segunda-feira, 19 de maio de 2014

Cultivando o jardim: a permacultura de fora é a permacultura de dentro




          Por que tem coisas que escutamos e não esquecemos? Uma delas ouvi em um encontro de permacultura: o que vem primeiro, o jardim ou o jardineiro? Perguntas são filosóficas. Na ocasião, por mais que a pergunta incomodou, não obtive resposta. Somente mais tarde descubro que o autor dessa frase é Rubem Alves: "O que se encontra no início? O jardim ou o jardineiro?" Para meu sossego, também encontro uma resposta que me satisfaz (não aquela dada pelo autor): responderam-me que os dois são importantes. Sim, como pode existir jardim sem jardineiro ou, o contrário, jardineiro sem jardim?. Comparativamente: não há permacultor sem permacultura ou vice-versa. Quando existe permacultura fora também acontece a permacultura interior. A metáfora diz que sentir-se jardineiro é sentir a presença do ser maior: criador e cultivador do mundo. Isso me faz pensar que ser permacultor é ser jardineiro.



  
          Tornar-se permacultor é isso: apoderar-se do poder da criação e do cultivo. Permaculturar no jardim-quintal significa mais do que colocar as mãos na terra e cultivar, significa cultivar a si mesmo, restabelecer a relação perdida com a natureza, cultivar boas relações com os outros. Em harmonia com “o verde das folhas, o colorido das flores, as variadas simetrias das plantas, os pássaros, as borboletas, os insetos, as fontes, as frutas, o perfume ...”[i]  nosso interesse volta às metas espirituais e não àquelas materiais.  A permacultura e o metamorfosear-se (tal como o das borboletas) conduz ao encontro da simplicidade, e, em uma vida simples, natural, sustentável os dias deixam de ser jornadas vazias por estarem completamente reencantados. Na simplicidade voluntária, com o consumo só do necessário, é possível alcançar uma felicidade ainda não experimentada: uma felicidade simples, com coisas simples, fazendo coisas simples. Sim, é fato, com a transformação da paisagem exterior magicamente a paisagem interior também se transforma.



         O cuidado com o jardim de hortelãs, alecrim, manjericão, de vegetais, de flores, exige atenção, dá trabalho ... os jardins se transformam o tempo todo: nascem, crescem, florescem, perdem as folhas, deixam de ser. Ao estar entregues ao cuidado do jardim nos voltamos a nós mesmos, nos descobrimos na simplicidade do ser, nos encontramos com o yoga. O estudo e a prática do yoga abre um novo mundo diante de nós. Se por aí compartilhamos o sentimento do vazio, do desespero, se por aí levamos uma vida niilistas, agora, renascemos, nos encontramos cheios (de sentido),  encantados transbordamos alegria, amor, sentido. Finalizo compartilhando nosso sentimento de que o yoga em nossa vida – abre as portas do mundo, ascende uma luz dentro de nós e nos coloca a caminho da autorealização.



          O grande ensinamento consiste no aprendizado do desapego que não corroe como um verme, o grande desapego: que ama, e que quanto mais se desapega, mais ama[ii].

         



[i] Encontra-se em uma fábula de Rubem Alves.
[ii] In: F. Nietzsche . Assim Falava Zaratustra, terceira parte: do intenso desejo.