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terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Dois em um



O quanto de ti ficou em mim
Que parte de mim ficou em ti
Não se pode mensurar
Os encontros no caminho são outras faces de quem se é
Por sintonia e energia,
muitos passarão e outros ficarão
Não pela comunhão do corpo 
E sim pelo íntimo encontro do coração,  do espírito
Que acontece na música dedilhada
No tempo que flui 
Carregando e deixando um pouco do que foi
Presente
No entrecruzamento das histórias,
dos caminhos paralelos
Na impermanência que é a vida
Onde o tudo (de um noite) torna-se 
Noutro dia nada
No devir
Onde o Um pode vir a ser o Todo
E o amor expandir-se 
Não para ser mais nem menos
Apenas ser
Assim como é o amor de uma criança

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

A criança interior


“Saiba todo mundo foi neném
Einstein, Freud e Platão também (...)
Saiba: todo mundo teve infância (...)
Arquimedes, Buda, Galileu
E também eu e você”


Todo mundo foi neném, criança e teve infância. E, quem já foi criança viveu a simplicidade, a verdade, a espontaneidade do ser da criança. Experenciou a leveza, a compaixão, a presença e a alegria própria da essência da criança. Quem teve infância, aos poucos, sem perceber perdeu o que é própria da criança; sem perceber deixou de ser presença, de viver no aqui e agora, deixou para trás o riso fácil, o brincar e a autenticidade do existir. E, por que? É devido a educação que deixamos de ser a criança que outrora fomos; é em função do ato educador do adulto que encobrimos o espírito da criança, o nosso ser divino que, agora, procuramos resgatar ou desocultar na busca pelo quem somos.


Nos esforçamos para desencobrir a nossa criança interior e nos tornarmos o que já fomos: autênticos, leves, verdadeiros, espontâneos, alegres, pacíficos, amorosos, equilibrados. Eis o objetivo do caminho espiritual, da jornada de autoconhecimento, do cuidado de si: despertar essa criança que mora dentro de cada um de nós. Mas, não podemos chegar até aqui sem entrar em contato com a criança ferida, reprimida, amedrontada, abandonada e podada pela educação recebida que, basicamente, se resume a uma relação de conflito entre os adulto-educador e a criança. O conflito acontece porque aquele que se esforça para educar e age convencido de estar cheio de amor, cuidado e sacrifício não é capaz de compreender a criança e, além disso, porque ele é um egocêntrico em relação à criança.


Quando, ao criar e educar nossos filhos, optamos seguir um caminho diferente daquele em que fomos educados percebemos que temos a chance de olhar para nós mesmos, para a nossa criança interior, isto é, para a criança psíquica que somos e, assim, adentramos na esfera do espiritual. Montessori afirma que “todo desenvolvimento espiritual é uma conquista da consciência que assume aquilo que ainda se encontra fora dela”. Aquilo que está fora da consciência é justamente o que mora nos porões da consciência - no subconsciente. Quando assumimos a educação de uma filho o oculto pode vir à tona, ou seja, pela criança que temos tomamos consciência da criança que fomos e somos. Assim, o ato de educar um filho, do mesmo modo que a terapia e a meditação, pode nos fazer voltar para nós mesmos e nos curar das feridas da infância. Ele pode nos conduzir a uma descoberta e, assim, a um engrandecimento de nós mesmos. Pela descoberta, engrandecimento e aperfeiçoamento avançamos no caminho espiritual, nos aproximamos do divino que há em nós.  

(Montessori, M. O segredo da infância. Campinas - SP: Kírion, 2019, p. 24)