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sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Onde buscamos chegar, a criança já está!


Quem não quer encontrar o equilíbrio? A paz nas relações,? A felicidade? A unidade: mãos-mente-coração? Nós, enquanto adultos, vivemos a separação entre sentir, pensar e fazer. Quantas vezes pensamos algo e fizemos outra coisa? Quantas e tantas vezes damos ouvidos ao pensamento e não aos sentimentos? A separação dessas três dimensões nos faz vivenciar um enorme desequilíbrio: não temos paz nem tranquilidade, não vivemos o aqui e agora. Apesar de não viver a unidade sentir-pensar-agir, sempre buscamos chegar até aqui, e, isso acontece quando nos sentimos inteiros completos e felizes, por exemplo, dançando, ouvindo música, praticando yôga ou uma atividade artística. Aqui onde buscamos chegar, a criança já está! Se permitimos o desenvolvimento natural e em liberdade da criança, o seu trabalho (atividade em que ela constrói a si mesma) e a sua concentração (estado de atenção e/ou silêncio introspectivo) teremos uma criança sendo aquilo que natural e espontaneamente ela já é: alegre, tranquila, amorosa, generosa, gentil, pacífica, equilibrada.

A criança pequena vive, inicialmente, no presente, no aqui e agora, ou seja, é presença. Tanto é assim que ela não sabe esperar, mas, com o passar dos anos ela perde a capacidade de concentração, em outras palavras, deixa de estar no aqui e agora, deixa de estar atenta,  deixa de viver a unidade entre agir-sentir-pensar. A perda da concentração, ou ainda, o deixar de ser presença é algo que inevitavelmente acontece porque afinal de contas vivemos em um mundo e como ser-no-mundo incorporamos a noção de presente, passado e futuro.

Aqui em casa, por volta dos três anos, percebemos que nossa criança começou a desenvolver a capacidade de saber esperar, de lembrar de detalhes do seu passado e de entender sobre o futuro quando, por exemplo pergunta: quando é sexta? Isso revela que a criança que, de início, vivia o aqui e agora, sem apego ao passado e sem preocupação com o futuro, aos poucos deixa de ser presença; deixa de estar inteira e completa em cada situação, deixa de viver atenta e absorvida pelas coisas de que se ocupa. Há uma ruptura, uma separação que acontece porque além da incorporação da noção de tempo, a criança, segundo Montessori, deixa de ter liberdade de poder fazer aquilo que é importante para ela, para a sua construção interior. Ela deve se adaptar ao mundo do adulto, fazer aquilo que elE acha ser o melhor para ela e não tem a oportunidade de trabalhar para construir a sua vida interior.

Quando seguimos o caminho de educar com Montessori, organizamos  ambiente e, igualmente, nos comprometemos com a nossa autoeducação para dar à criança a oportunidade da concentração. Isso quer dizer, "deixamos a criança ficar em paz", ou ainda, deixamos ela trabalhar com aquilo que lhe interessa, por tanto tempo e quantas vezes ela quiser, e, em silêncio. E, no silêncio atento, ela vai construindo a si mesma, vai trabalhando fora com as mãos e construindo o seu eu por dentro. É por isso que "a concentração não é pouca coisa. Não é uma habilidade que uns tem e outros não (...) a concentração é o ser humano entrando em contato consigo, é a experiência mais profunda que a criança pode viver, e é uma experiência que transforma a maneira como a criança vive a vida e a ajuda a alcançar um belíssimo equilíbrio interior" (Gabriel Salomão, no texto: O milagre da concentração)



Imagem retirada do site: despertarcoletivo.com

E a concentração, não faz o mesmo com o adulto-educador? A concentração enquanto atenção (estar atento) , ou ainda, enquanto presença (estar no aqui e agora) não é outra coisa senão meditação. Meditar, de modo geral e bastante simples, pode ser compreendido como sendo a busca pelo silêncio interior que acontece quando conseguimos estar no aqui e agora, sentados de maneira confortável e relaxada em um espaço ou em casa ou na natureza. O silêncio é uma conquista positiva que obtemos por meio da disciplina de sentar regularmente e por um tempo a sós com nós mesmos. Meditar, que no início pode ser um exercício bastante desafiador, nos eleva a um grau superior, um grau ainda desconhecido para a maioria dos novos educadores, isso porque, meditando nos retiramos da nossa existência ordinária, quer dizer, nos distanciamos ou desconectamos da nossa vida comum e voltamos para dentro, entramos em contato com aquilo que somos: nossas crenças limitantes, padrões de pensamento, sentimentos, enfim, é um contato íntimo com nós mesmos. 

Certamente, quando buscamos encontrar o silêncio interior educamos, tanto a criança quanto a nós mesmos, a partir de uma perspectiva de maior clareza, compreensão, paciência, calma, humildade e amorosidade. A meditação nos permite ser mais presença (estar inteiro e presente) diante da criança e no mundo; nos convida aceitar as coisas tal como elas são, o que, efetivamente, é uma lição bem proveitosa quando se está diante dos desafios de educar a nova criança. Quando descobrimos essa capacidade de aceitação deixamos de “perder a paciência” porque o que está fora não mais nos perturba, deixamos de reagir de maneira raivosa porque não vemos o que acontece como confronto mas oportunidade de crescimento e de conquista como, por exemplo, do autocontrole, da paz interior, de tranquilidade. É a partir daqui, de um estado elevado, que deveria partir a prática da educação da nova criança, a educação que promove a paz e que poderá salvar a humanidade.




 

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