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terça-feira, 20 de setembro de 2016

O Ayurveda e nossas avós


Tatiana Palm


 
Ayurveda é conhecida como a medicina indiana e vem ganhando adeptos em todo o mundo. Ouvi que podemos considerar o Ayurveda, de maneira simplificada, como sendo o conhecimento que, outrora, nossas avós possuíam, praticavam e partilhavam[1]. Se nos voltarmos para o significado da palavra temos: ayur, que significa vida e veda, que significa conhecimento. Ayurveda é, assim, o conhecimento - dado dentro do Vedas (textos sagrados indianos) – da vida. A vida, por sua vez, é compreendida como aquilo que se dá aqui e agora, no presente, e também como uma teia (a conexão de tudo com tudo). Ela se constitui a partir da combinação de cinco elementos (forças naturais) chamados de bhutas: terra (Prithvi), água (Ap), fogo (Agni), ar (Vayu) e éter (Akasha). Assim, o Ayurveda, em última instância, pode ser chamado de a ciência da vida ou o conhecimento dos cinco elementos.

Terra, fogo, água, ar e éter fazem parte de tudo aquilo que existe, estão em mim e fora de mim, em tudo o que é vivo. É de acordo com a combinação desses cinco elementos que se define a constituição ontológica de uma pessoa, o dosha. Ela é Pitta se o que predomina em sua constituição psicofísica é fogo e água; é Kapha, se é constituída predominantemente de água e terra; por último, é Vata se o que possui em maior proporção é éter e ar. É importante colocar que cada um de nós possui em sua constituição todos os cinco elementos, mas em proporções diferentes e é precisamente isso que faz com que se defina o que cada um é, ou seja, a o seu dosha. Para o Ayurveda, a saúde de uma pessoa depende do equilíbrio entre os cinco elementos, ou, em outras palavras, dos três doshas. A doença se manifesta no corpo quando existe o desequilíbrio entre Pitta, Kapha e Vata. O que adoece, na verdade, é o dosha predominante, aquele que faz com que cada um seja tal como é tanto em seus aspectos físicos quanto em suas tendências psicológicas.


Se é o desequilíbrio dos cinco elementos que nos constituí o que ocasiona a doença, então, a pergunta central é: o que fazer para manter ou reestabelecer o equilíbrio dessas forças naturais em nós? O Ayurveda é muito mais uma medicina preventiva do que imediatista. Ele se preocupa, antes de tudo, em orientar para viver em equilíbrio, quer dizer, se preocupa em não deixar as pessoas adoecerem. Bem, para equilibrar fogo, terra, água, ar e éter em nosso corpo é fundamental olhar para a alimentação. É pelos alimentos que ingerimos esses cinco elementos que são distribuídos pelo corpo bem como as toxinas (ama) que se acumulam no interior de nosso organismo. Entretanto, o organismo humano, enquanto um microcosmos, é influenciado pelo ritmo do macrocosmos. No plano do macrocosmos temos, por exemplo, as estações do ano e as partes do dia: manhã, meio-dia, tarde e noite. Os cinco elementos existem tanto em nós quanto fora de nós, por isso, para manter o equilíbrio dentro de nós, é essencial olhar para fora e compreender como essas forças naturais se apresentam no movimento do dia e no ciclo das estações.

 Pelo fato de que o fora está dentro, então, no Ayurveda é importante, além do cuidado com alimentação (que deve ser de acordo com o dosha de cada um), a criação e manutenção de uma rotina e de certos hábitos, o que é chamada de dinacharya. Isso deve levar em conta o fato de que no período da manhã as forças atuantes são água e terra, no período do meio-dia é o fogo e a água, enquanto que, no período da tarde é ar e éter e, por fim, no período da noite volta a ser água e terra e, mais tarde da noite, fogo e água. Não menos importante é adaptar a nossa rotina, hábitos e alimentação as estações do ano já que também na primavera, verão, outono e inverno há a presença dos cinco forças, em proporções diferentes, em cada época. Neste caso, comparativamente, podemos dizer que a primavera corresponde ao período da manhã, o verão ao meio-dia, o outono a tarde e, por sua vez, o inverno a noite. O comportamento adequado aos ciclos da natureza é chamado de rutucharya.
 
 É principalmente aqui, mais precisamente no que diz respeito ao rutucharya e a dinacharya, que o Ayurveda se aproxima do conhecimento colocado em prática pelos nossos avós, ou seja, daquilo que os nossos avós faziam e que nós também podemos fazer. Um dos hábitos do passado era respeitar o ritmo natural pela observância e respeito da natureza. Por exemplo, acordar (antes do sol) e jantar e dormir cedo (bem antes das 22hs). Isso é bastante valorizado no Ayurveda porque o período matutino (entre as 4  e  6 hs) é o momento de água, o que quer dizer, que além de ser fresco, é expansivo e energizante enquanto que no final do dia (entre as 18 e 22 hs), é o momento kapha (terra e água), então, o jantar deve ser leve para que não seja demandado o fogo em momento inadequado. Já dormir cedo é importante porque e por volta das 23:30 acontece em nós o renascimento, isto é, é o momento alto em que se produzem as serotoninas, dopaminas, etc. Outro exemplo pode ser dado em relação aos alimentos, primeiro, em relação a sobremesa. É comum entre nossos avós o hábito de servir o doce somente um bom tempo depois do almoço (por volta das 15hs). Segundo orientações ayurvédicas, o açúcar esfria a digestão, por isso, é inapropriado ingeri-lo logo após as refeições já que agni (o fogo) está sendo exigido e está alto em nós.

Além disso, nossos avós valorizavam tanto o consumo de alimentos saudáveis e cultivados na própria horta quanto a combinação dos alimentos e o próprio ato de cozinhar em casa. O que, de maneira geral, é consideramos hoje uma perda de tempo já foi um hábito saudável pois ao cozinhar é possível controlar o modo de preparo e a escolha dos ingredientes. Para o Ayurveda, é de fundamental importância a combinação dos alimentos, o modo de prepará-los e a própria energia de quem o prepara. O agradecimento, que costumava fazer parte das refeições servidas pelos nosso avós, também faz parte das refeições indianas: é uma maneira de transmutar a energia ruim que pode estar no alimento. E para finalizar, queremos lembrar que nossos avós faziam o uso de chás que eram cultivados em casa e que serviam como remédios naturais. Um terapeuta ayurvédico além de uma orientação acerca da alimentação recomendará o uso de ervas medicinais, pois, combinadas com a dieta alimentar contribuem na recuperação do equilíbrio psicofísico de cada um. Enfim, podemos dizer que, tanto no Ayurveda quanto na sabedoria dos nossos avós encontramos orientações de como viver em equilíbrio, de modo saudável e sustentável.

 



[1] Este texto foi inspirado pela escuta de um programa de rádio chamado Himalaya’s ConexiOm, (apresentado na rádio dinâmicofm) e que tem como proposta oferecer uma conexão entre o oriente e o ocidente.

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