A sociedade do cansaço,
um livro do pensador coreano Chul Han, evidência que o homem pós-moderno, isto
é, o ser-no-mundo que nós somos vive a realidade do excesso de trabalho, da
superprodução, da autoexploração, da superinformação, da superabundância, da
comunicação generalizada, da maximização do desempenho e da superatenção.
A
maioria de nós, atualmente, é vítima do excesso de estímulos, informações, de
trabalho e de cobranças em relação a si mesmo. Em casa, no mundo do trabalho,
na academia, na criação dos filhos, etc, nos cobramos para ter um bom
desempenho, nos esforçamos para nos tornar sempre melhores, ser mais
produtivos, bem sucedidos, autênticos (comprometido em ser nós mesmos, em
descobrir e mostrar nosso potencial), perfeitos.
Para
produzir sempre mais e melhor, para aparentar ser mais e melhor, para ter mais
e do melhor, a maioria de nós cobra de si mesmo tal como um senhor cobra do
escravo. Hoje em dia, nos sentimos orgulhosos quando podemos dizer que somos
senhor de si mesmo, chefe de si mesmo, empreendedor de si mesmo, porém, não
percebemos que sofremos um novo tipo de exploração, a autoexploração. Essa
forma de exploração é mais eficiente do que a de outros tempos porque é uma
exploração que não vem do outro (senhor ou patrão), mas de si mesmo. “O
explorador é ao mesmo tempo o explorado” (p.30)
O
ser-no-mundo atual autoexplora-se no nível físico a ponto dele estar sempre
fazendo, fazendo e fazendo; é um fazer hiperativo, excessivo, que cansa e
esgota. Igualmente, explora-se no nível mental, pois não pára de pensar,
planejar, calcular, cuidar. Por causa da vida acelerada e hiperativa, hoje
temos uma atenção dispersa e difusa, que muda rapidamente de foco, que
perambula inquieta de lá para cá, e, portanto, de curta duração. Temos uma
atenção multifocal, quer dizer, uma hiperatenção, que por ser tão ampla é, ao
mesmo tempo, superficial.
No
mundo atual vivemos, então, uma aceleração do lado de dentro e do lado de fora.
Em geral, corremos, e, estamos sempre correndo, mas vivemos com a sensação de
nunca chegar onde se quer chegar. Até quando dormimos, fizemos essa pausa para
ter energia para, no outro dia, seguir correndo, produzindo, aparecendo,
sobrevivendo. Não paramos nunca, porque nos cobramos muito e não conseguimos
relaxar; se fizemos uma pausa nos sentimos mal, desconfortáveis e com culpa por "estar fazendo nada" e medo de perder o controle das coisas, de quebrar a rotina.
Uma sociedade marcada pela produtividade, pelo desempenho (esforço), pelo excesso de cobrança em relação a si mesmo (autoexploração), cansa, esgota e adoece. Ela diz o tempo todo que precisamos nos esforçar mais e fazer por nós mesmos, que não somos bons o suficiente já que não conseguimos dar conta de tudo, que não podemos parar, relaxar, entregar-se ao “dolce far niente”. Nessa sociedade nos tornamos pessoas aceleradas, e a aceleração do nosso ritmo de vida nos impede de vivenciar duas coisas fundamentais para uma vida saudável, equilibrada e criativa: a pausa e a atenção profunda.
Na
sociedade do desempenho e do cansaço, na vida de aceleração e distração, não há a pausa, que é necessária para criatividade. Pausamos quando estamos
na natureza, quando nos desconectamos e desaceleramos. Ao diminuir o ritmo
acelerado que vivemos (tanto do lado de fora quanto de dentro) conseguimos ver
o mundo de maneia mais atenta, de modo mais concentrado, enfim, quanto menos
distraídos, mais atentos e capazes de olhar demoradamente, de contemplar o que
existe, de ver milagre no banal e simples.
É
da contemplação, da atenção profunda, da concentração atenta (conforme constata
Han e também a médica e educadora italiana Montessori) que nasce a cultura. Ou
seja, a filosofia, a arte e, igualmente, as grandes descobertas que promovem o
progresso do mundo civilizado acontecem a partir da contemplação, da observação
atenta, concentrada, demorada, profunda da realidade. Por fim, o que resulta da
falta de pausa e da superatenção, é, então, uma carência criativa. Talvez isso
explique porque, conforme ouvi a poucos dias atrás, os jovens adultos atuais lêem
bastante, mas produzem muito pouco!!
Texto maravilhoso! Parabéns!
ResponderExcluirNunca vivemos tempos tão fugazes, fugidios e instáveis como atualmente. Perdemos a noção de tempo, de espaço, perdemos a tangibilidade das coisas. Somos seres difusos, sem sentido e sem rumo algum. A todo o momento procuramos otimizarmo-nos, corremos atrás de superar e produzir cada vez mais, transformamos coisas complexas e profundas em objetos amorfos e escorregadios, e com isso, criamos e cumprimos metas sem saber o porquê, justamente porque nunca paramos para avaliar o sentido das coisas.
Estamos, sobretudo, vivendo numa vida cujo fim tornou-se ela mesma, como o próprio Chul-Han disse: "desnarrativamos" a existência. Afinal, toda a narrativa possui altos e baixos e uma conclusão. Hoje, aquilo que se conclui é expurgado, é aniquilado; aquele que para, que se estagna no tempo, torna-se invisível.
Ainda bem q existem pessoas que se atrevem a "parar" para escrever textos bons, como os teus hahahah! Mais uma vez, parabéns!
Gracias pelo comentário!!
ExcluirVôce tem espírito filosófico :)